Uma Emenda Constitucional (EC) 95/16), do teto dos gastos, que congela investimentos públicos em todo o Brasil. Esse será o efeito perverso do PLP 39/20, aprovado por Câmara e Senado na semana retrasada para fornecer auxílio emergencial a estados e municípios durante o período de calamidade pública e enfrentamento da pandemia do novo coronavírus no Brasil. A proposta sofreu um revés e com interferência de Paulo Guedes e do governo Bolsonaro junto ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre, o texto exige contrapartidas dos servidores e serviços públicos e engessa o setor até pelo menos dezembro de 2021.
No artigo, o secretário de Assuntos Jurídicos, Parlamentares e de Classes da Condsef/Fenadsef, Edison Cardoni, destrincha e esclarece pontos do PLP 39/20 que afetam todo Estado brasileiro em troca de uma ajuda financeira que, especialistas alertam, será insuficiente para auxiliar estados e municípios. Na prática, a proposta não só retira direitos de servidores públicos e impõe um arrocho salarial, já que a maioria está com salários congelados há mais de três anos, como afeta toda sociedade. A política de austeridade ultraneoliberal conduzida pela governo Bolsonaro é um entrave para o enfrentamento da pandemia e será desastrosa no cenário pós-pandemia, é também o que asseguram especialistas.
O artigo de Cardoni resume intervenções feitas representando a Condsef/Fenadsef em live organizada pelo Fonasefe na última sexta-feira, 8. Assista aqui a live.
Confira a íntegra do artigo:
PLP 39/2020: de onde sairá a ajuda aos estados e municípios?
Bolsonaro-Guedes-Maia-Alcolumbre querem tirar dos serviços públicos
Num valor insuficiente, a necessária ajuda aos estados e municípios em meio à pandeia da Covid-19 foi aprovada, em 07.05, na forma do PLP 39/2020, depois de idas e vindas entre o Senado e a Câmara Federal.
Por pressão do governo Bolsonaro, o Senado acrescentou ao projeto inicial certas “contrapartidas”, concentradas nos artigos 7º e 8º do PLP
São medidas que enfraquecem os serviços públicos. E num momento em que eles se mostram mais necessários do que nunca para a população trabalhadora.
Ademais, o PLP 39 agrava restrições já existentes na Lei Complementar 101 – lei mal denominada de “responsabilidade fiscal”, adotada no governo FHC por imposição do FMI – e ainda faz concessões à especulação financeira: o Art. 6º, traz uma problemática permissão para os estados e municípios securitizarem suas dívidas, o que abre a possibilidade de as receitas futuras ficarem na mão dos especuladores.
O Art. 7º reduz o intervalo de tempo entre eleições em que os entes públicos estão autorizados a realizar qualquer ato que aumente despesa com pessoal, desde reajustes salariais até a contratação de aprovados em concurso público.
Na prática, isso pode significar que novas contratações e a possibilidade de reajuste salarial futuro para os atuais servidores e empregados públicos federais só poderiam ocorrer se incluídas no orçamento de 2023 para vigorar em 2024!
O Art. 8º estabelece, até dezembro de 2021, o congelamento dos salários e de uma série de atos que aumentem despesas com servidores e empregados púbicos. Também estão proibidos novos concursos, exceto em algumas situações como reposição de aposentadorias e seleção para contratos temporários.
Não havia e nem há no horizonte governos municipais, estaduais e muito menos o federal que estejam vislumbrando a aprovação de novas leis que concedam reajustes para servidores ou empregados públicos.
Por isso mesmo o congelamento salarial afeta, sobretudo, a massa desses trabalhadores que recebe os menores salários, que poderiam ser majorados por leis de âmbito nacional, em janeiro de 2021: o reajuste do salário mínimo, ou, no caso dos professores, o reajuste do piso nacional do magistério da educação básica (Lei 11.738 de 2008).
Atenção aos detalhes
No texto finalmente aprovado e que seguiu para sanção presidencial, os segmentos da saúde, assistência social, limpeza urbana, serviços funerários, trabalhadores da educação, entre outros, por pressão das entidades sindicais e partidos de oposição, foram excluídos de parte das restrições do Art. 8º, aquelas mencionadas nos incisos I e IX (os militares já estavam excluídos). A saber, esses setores não seriam atingidos pelo congelamento dos salários nem pelo congelamento da contagem de tempo de serviço para progressão funcional, anuênios, etc. (parágrafo 6º do Art. 8º).
No entanto, o mesmo parágrafo que fixa a exceção também determina que esses servidores só ficarão livres dos congelamentos “desde que diretamente envolvidos no combate à pandemia da Covidl-19”, o que reduz em muito o seu número.
Se lembrarmos que, para todos os setores, fica proibida a realização de concursos que aumentem o quadro de servidores – inclusive na saúde, assistência social, educação…- vemos que em vez de garantir a oferta de mais e melhores serviços públicos o PLP 39 mantém a tendência de redução da assistência estatal à população. É a continuação da política restritiva da Emenda Constitucional 95 que congelou os investimentos públicos por 20 anos.
O PLP 39 traz também mais um ataque à aposentadoria dos servidores municipais porque autoriza os municípios a suspenderem o recolhimento de contribuições previdenciárias patronais devidas aos respectivos regimes próprios. Será um rombo na previdência municipal estimado em 19 bilhões.
Uma notável exceção dentro da exceção é que no mesmo momento em que tramitava o PLP 39 o Ministério da Defesa editou uma Portaria Normativa 42 criando uma comissão permanente para estudar e propor reajustes periódicos aos salários dos militares. E, também simultaneamente, tramita uma consulta, já com parecer favorável da AGU, para que os militares possam receber acima do teto constitucional – como já ocorre com juízes e procuradores. Esse novo desrespeito ao teto, que hoje é de R$ 39 mil, beneficiaria de imediato os militares da reserva que integram o primeiro e segundo escalões do governo e só está momentaneamente suspenso por causa da pandemia.
Quais os valores envolvidos e quem pagará a conta
Conforme tabela publicada pelo Senado, o PLP 39 prevê a entrega de cerca de 60 bilhões de reais aos estados, municípios e ao DF. Esses entes subnacionais também ficam autorizados a suspender temporariamente o pagamento de parcelas de dívidas diretamente com a União ou com seu aval, num montante estimado de outros 60 bilhões.
Ocorre que, segundo cálculos do próprio governo, no projeto inicialmente acertado por Guedes-Alcolumbre, as “contrapartidas” previstas iriam gerar, até dezembro de 2021, uma “economia” de cerca de 120 bilhões nos gastos com os servidores públicos da União, dos estados, municípios e do DF.
Ou seja, eles não previram nenhuma “ajuda” efetiva, mas somente um adiantamento federal do que seria tirado diretamente do bolso dos servidores e empregados públicos!
Não é possível fazer uma verificação nos cálculos que o governo tem apresentado. De todo modo, é também o próprio governo quem afirma que a ampliação, finalmente aprovada, do número de categorias que podem ser excetuadas dos congelamentos salarial e de contagem de tempo fez cair a “economia” para 43 bilhões.
Portanto, mesmo com novas categorias excetuadas, será dos gastos com os servidores – portanto, do serviço público – que sairá a maior parte da “ajuda” que o governo federal destinará aos estados e municípios (mais de 70% dos 60 bilhões).
Pior ainda, Bolsonaro já anunciou que vai vetar o parágrafo 6º do Art. 8º, restabelecendo os congelamentos para todos os servidores, como quer Paulo Guedes. Caso isso aconteça a “economia” volta para os 120 bilhões!
Repetindo, é evidente que, diante da crise, os estados e municípios precisam de ajuda federal para recompor suas receitas e fazer frente à epidemia. É com a união que está a chave do cofre, a possibilidade de ampliar a base monetária (imprimir papel moeda), emitir títulos da dívida pública, utilizar as reservas internacionais.
Ao contrário disso, o governo Bolsonaro – com a ajuda do Congresso e do STF – utiliza a crise aberta pela pandemia para adotar medidas que protegem os patrões e atacam os trabalhadores (MPs 927, 936, por exemplo) e, com o PLP 39, reforça a pressão pela redução do serviço público.
Caso se confirme o veto de Bolsonaro estaremos chamados a construir a mais ampla unidade por sua derrubada, o que vai exigir ampliar as mobilizações de rua – respeitadas as consignas de segurança sanitária, como uso de máscaras e distanciamento.
Afinal, se quem puder deve ficar em casa, mantendo a quarentena, também é necessário manter a luta em defesa de todas e cada uma de nossas reivindicações o que cada vez mais se confunde com a luta pelo fim do governo Bolsonaro.
Neste 12 de maio, além de parabenizar pelo seu dia as Enfermeiras e Enfermeiros, devemos nos apoiar no exemplo deles que, por sua profissão, estão na linha de frente do combate à Covid-19 e, com seus atos de rua, se colocaram também na linha de frente da defesa dos direitos.
Condsef/Fenadsef