A Câmara dos Deputados aprovou na noite dessa terça-feira (30), o Projeto de Lei (PL) nº 490, que legitima o chamado Marco Temporal. A tese, aprovada por 283 deputados contra 155, e uma abstenção, exclui a possibilidade de demarcação de terras indígenas daqueles que não estavam nelas até o dia da promulgação da Constituição, no dia 5 de outubro de 1988.
Para o secretário do meio ambiente da CUT Nacional, Daniel Gaio, a aprovação do PL do Marco Temporal pela atual legislatura da Câmara, comandada por Arthur Lira (PP-AL), é um reflexo do domínio da Casa pela bancada conservadora e ruralista.
“Este é um dos mais duros e cruéis ataques da Câmara na história do país aos povos indígenas originários, ao povo brasileiro de forma geral, e ao meio ambiente”, afirma.
Gaio, no entanto, diz que o marco temporal sofrerá resistência tanto dos povos indígenas como dos movimentos sociais. O projeto ainda precisa ser aprovado pelo Senado e ainda há no Supremo Tribunal Federal (STF), uma ação sobre a demarcação de terras indígenas, que está na pauta de votação para o dia 7 de junho.
“O Brasil e o mundo não podem aceitar um ataque deste tamanho, ainda mais na atual conjuntura em que os países procuram soluções para a crise climática, o aquecimento global. Os povos indígenas seguem luta e essa luta é de todos nós”, conclui.
Outras atrocidades do marco temporal
Na prática o marco temporal abre espaço para avanços do agronegócio e da devastação sobre territórios originários, permite a exploração de recursos hídricos, energéticos, minerais e de instalação de infraestrutura nos territórios tradicionais, o que trará graves consequências à flora, à fauna e a todo meio ambiente.
A medida permite, por exemplo, que “em situações utilidade pública”, “intermediários em ação estatal” possam quebrar essa proteção. O conceito de utilidade pública, porém, não define critérios ou situações para esse tipo de atuação.
O PL também coloca em risco os povos indígenas isolados. Para entidades indigenistas, a inclusão dessa proposta permitirá missões religiosas para catequizar indígenas não contatados, colocando a própria saúde desses povos em risco. Os intermediários ainda poderão ser também entidades particulares nacionais e estrangeiras.
Ministério dos Povos Indígenas repudia a aprovação do marco temporal
O Ministério dos Povos Indígenas (MPI), comandado por Sonia Guajajara, divulgou nota ainda terça-feira em que classificou a aprovação do marco temporal pelos deputados federais como um “genocídio legislado”.
“O PL 490 representa um genocídio legislado porque afeta diretamente povos indígenas isolados, autorizando o acesso deliberado em territórios onde vivem povos que ainda não tiveram nenhum contato com a sociedade, nem mesmo com outros povos indígenas, cabendo ao Estado brasileiro atuar também pela proteção dos territórios onde vivem estes povos”, diz a nota.
A votação na Câmara dos Deputados
Os parlamentares governistas, em bloco, votaram contrários à tese, bem como a minoria e outros blocos de partidos que englobam PT, Psol, Rede, PCdoB e PDT. Liberaram a bancada MDB e PSB. Toda a bancada ruralistas composta por 251 deputados federais de um total de 513, votaram a favor da devastação do meio ambiente.
A matéria agora será encaminhada ao Senado Federal, onde não deverá contar com tramitação acelerada, como na Câmara, apesar da bancada ruralista ter 31 dos 81 senadores. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, disse nesta quarta-feira (31), que o projeto do marco temporal das terras indígenas não tramitará em regime de urgência no Senado, ao contrário do que ocorreu na Câmara dos Deputados, informou a Agência Senado.
A ação no Supremo
O STF analisa uma ação do Instituto do Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina (IMA) contra o povo Xokleng, que, segundo a entidade, ocupou uma área indígena localizada na Reserva Biológica de Sassafrás, distante aproximadamente 200 quilômetros de Florianópolis, após a data de promulgação da Constituição de 1988.
O recurso sobre o marco temporal de terras indígenas tem repercussão geral. O julgamento do tema permitirá a resolução de cerca de 82 casos semelhantes que foram suspensos em outras instâncias da Justiça brasileira.
O placar do julgamento do marco temporal no STF está empatado em 1 a 1. O relator do caso, ministro Edson Fachin, em seu voto afirmou que a Constituição reconhece o direito de permanência desses povos independentemente da data da ocupação.
O ministro Nunes Marques, por sua vez, votou a favor da tese. Em sua justificativa, ele considerou que os interesses dos indígenas não se sobrepõem aos interesses da defesa nacional.
Portal CUT