Servidores públicos das três esferas de governo se articulam e prometem deflagar uma greve nacional, como forma de pressionar o governo federal frente à ameaça de perdas para a categoria, previstas na proposta de reforma administrativa, como o fim da estabilidade para novas contratações e a redução de até 25% da jornada e dos vencimentos do funcionalismo, dispositivo que consta da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) Emergencial.
Os sucessivos adiamentos da apresentação da proposta de reforma administrativa pela equipe econômica é um dos reflexos dos alertas que têm sido dados ao Executivo por parlamentares que participam das negociações da categoria. O início da greve é uma das decisões que poderão ser tomadas, na próxima terça-feira, em Brasília, durante uma reunião plenária organizada por oito centrais sindicais. A articulação tem potencial de provocar instabilidade política, a exemplo do que ocorre nos países vizinhos ao Brasil.
Esta semana, a onda de protestos chegou à Colômbia, depois de Peru, Equador, Chile, Haiti e Honduras. Em Brasília, há um temor de que eventuais manifestações de servidores públicos atraiam a adesão de outras categorias profissionais descontentes com a agenda liberal do ministro da Economia, Paulo Guedes, o que poderia agravar ainda mais o clima de tensão nas ruas.
O envio ao Congresso, pelo presidente Jair Bolsonaro, do Projeto de Lei que trata do excludente de ilicitude é outro reflexo da preocupação do Planalto. Embora o chefe do governo tenha relacionado a medida ao reforço ao combate à criminalidade, o projeto também estabelece normas aplicáveis aos militares em operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e às várias forças de segurança.
Continua depois da publicidade
Plenária
Na terça-feira (26/11), o Teatro dos Bancários de Brasília vai sediar a Plenária Nacional em Defesa dos Serviços Públicos Municipais, Estaduais e Federais, das Estatais, do Brasil e dos Trabalhadores. O encontro vai discutir as privatizações de estatais e as reformas no funcionalismo. A pauta de propostas a serem deliberadas no evento deve incluir uma articulação junto ao Congresso, manifestações públicas e a greve.
“Com toda certeza, acreditamos que sairemos da Plenária com a agenda de manifestações e com encaminhamentos para pressões no Congresso Nacional e para discussão com as bases. A possibilidade de greve também não está descartada. A Plenária que deliberará sobre isso, mas temos visto muitos servidores pedindo paralisação”, disse Sérgio Ronaldo da Silva, secretário-geral da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef).
A Plenária em Brasília vai acontecer uma semana depois da reunião realizada no dia 18, na sede do Sindicato dos Químicos de São Paulo, entre lideranças de várias centrais sindicais brasileiras e políticos de partidos de oposição — PT, PSB, PCdoB, PDT, PSOL e Rede, com representantes dos trabalhadores do Chile e da Argentina. Segundo o site da CUT, o Encontro Emprego e Desenvolvimento debateu estratégias de enfrentamento ao neoliberalismo, que vem sendo implementado na América Latina.
Após um mês de rebeliões populares, Tamara Muños, diretora da Central Unitária de Trabalhadores (CUT-Chile), disse que “o país vive um momento de esperança na luta contra o neoliberalismo, que em sendo implementado há 30 desde o regime do general Augusto Pinochet e levou população à miséria”. Por sua vez, Roberto Bradel, secretário de Relações Internacionais da Central dos Trabalhadores Argentinos (CTA), defendeu a união dos movimentos sociais e centrais sindicais em torno de uma agenda comum contra o que considera retrocessos impostos à classe trabalhadora.
Alertas
A Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público tem aconselhado o governo a não insistir em propor mudanças polêmicas no funcionalismo. “Eu falei francamente com o Wagner Lenhart (secretário de Gestão e Desempenho de Pessoas do Ministério da Economia): se o governo insistir com essas propostas, o país poderá ser tomado por uma convulsão social”, disse o deputado federal Professor Israel Batista (PV-DF), presidente da frente parlamentar.
Batista e outros trinta parlamentares, governistas e de oposição, participaram, no dia 12, de uma reunião na residência oficial do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). O encontro teve o objetivo de dar os retoques finais à Agenda para o Desenvolvimento Social, lançada na última terça-feira na Câmara como contraponto às reformas econômicas do governo federal. Na ocasião, os participantes também expressaram preocupação com o risco de o país ser tomado por uma onda de protestos.
“Esse foi um dos assuntos tratados na nossa reunião. Eu, por exemplo, destaquei que, quando a população percebe que o Estado não está preocupado com suas necessidades mais urgentes, ela acaba questionando a própria democracia e suas instituições. Isso é muito preocupante”, disse a deputada Tabata Amaral (PDT-SP), que coordenou a seleção dos projetos da agenda social, que inclui um reforço de R$ 9,8 bilhões para o Bolsa Família (1/3 do orçamento anual do programa) e ações para geração de emprego e renda.
Estados Unidos
A elevação da temperatura dos debates em torno da reforma administrativa chamou a atenção do governo dos Estados Unidos. No dia 30 de outubro, o diplomata americano Frank DeParis, responsável pelos temas da macroeconomia, foi recebido na sede do Fórum Permanente de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), em Brasília. A entidade representa cerca de 200 mil servidores, incluindo membros do Ministério Público, delegados da Polícia Federal, advogados públicos federais e auditores fiscais.
O diplomata Frank DeParis queria entender melhor as críticas do Fórum à reforma administrativa e um relatório do Banco Mundial, que tem balizado o trabalho da equipe econômica. O representante americano agradeceu o encontro e solicitou a continuação do debate assim que o governo divulgar a PEC da reforma administrativa.
Correio Brasiliense