O salário mínimo atual (R$ 1.412) representa 20,85% do salário necessário para viver no Brasil, segundo cálculo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). O percentual é ainda menor do que representava o mínimo em 2020, primeiro ano de pandemia, quando o salário-base equivalia a 23,3% do ideal.
Veja a comparação entre o salário mínimo em vigor e o salário mínimo ideal nos últimos 15 anos:
A principal explicação para isso é a recomposição abaixo da inflação, inicialmente nos anos 1970, 1980 e 1990, e, mais recentemente, desde a pandemia de covid-19.
“O salário mínimo ficou 20, 21 e 22 sem ter aumento real, só foi reposta a inflação. Então, de novo, o salário mínimo que estava num processo de recompor o poder de compra ficou descolado desse outro movimento, que é da alta dos preços de alimentação. São dois processos paralelos”, cita Adriana Marcolino, diretora técnica do Dieese.
Como é feito o cálculo do salário mínimo ideal
A socióloga Adriana Marcolino afirma que a defasagem do salário mínimo começou na Ditadura Cívico-Militar, quando os índices de inflação estavam distorcidos e os valores não eram recompostos no piso nacional. Foram três décadas de recomposição abaixo do ideal até ser adotada a política de valorização do salário mínimo.
“Se você pegar o valor do salário mínimo de 1940, que foi o ano que o mínimo foi criado, hoje, em termos reais, ele seria R$ 2.548,22”, exemplifica.
Para chegar ao valor do salário mínimo ideal, o Dieese usa como referências:
- A previsão constitucional, segundo a qual o salário mínimo deve ser capaz de atender as necessidades do trabalhador e sua família quanto a moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social;
O Decreto-Lei nº. 399, que estabelece que o gasto com alimentação do trabalhador adulto não pode ser inferior ao custa da Cesta Básica de Alimentos; - A família composta por 2 adultos e 2 crianças, e a hipótese de que estas consomem o equivalente a um adulto.
“A gente calcula primeiro o gasto com alimentação, a partir da cesta básica pra uma família de quatro pessoas e depois a gente inclui os outros gastos com saúde, habitação, vestuário. Os outros dados a gente calcula a partir do que eles representam na POF [Pesquisa de Orçamentos Familiares]: peso da habitação, do transporte, do vestuário. Com isso, a gente chega ao valor do salário mínimo necessário”, explica a diretora do Dieese.
Veja variação do salário mínimo do Brasil nos últimos 30 anos:
- 2024 – R$ 1.412
- 2023 – R$ 1.320
- 2022 – R$ 1.212
- 2021 – R$ 1.100
- 2020 – R$ 1.045
- 2019 – R$ 998
- 2018 – R$ 954
- 2017 – R$ 937
- 2016 – R$ 880
- 2015 – R$ 788
- 2014 – R$ 724
- 2013 – R$ 678
- 2012 – R$ 622
- 2011 – R$ 545
- 2010 – R$ 510
- 2009 – R$ 465
- 2008 – R$ 415
- 2007 – R$ 380
- 2006 – R$ 350
- 2005 – R$ 300
- 2004 – R$ 260
- 2003 – R$ 240
- 2002 – R$ 200
- 2001 – R$ 180
- 2000 – R$ 151
- 1999 – R$ 136
- 1998 – R$ 130
- 1997 – R$ 120
- 1996 – R$ 112
- 1995 – R$ 100
- 1994 – R$ 70
Por que o salário mínimo ideal não é pago?
Economista-chefe da Leme Consultores e professor do IBMEC, José Ronaldo Souza Jr. cita duas razões que explicam a discrepância entre o salário mínimo pago e o salário mínimo ideal. Em primeiro lugar, o Brasil não é produtivo ao ponto de fomentar esse aumento de forma sustentável. Além disso, o custo da folha de pagamento na iniciativa privada poderia impulsionar a informalidade.
“Pra ter redução nessa distância, de forma sustentável e duradoura, a gente precisa que o país aumente sua produtividade, cresça de forma sustentável por anos seguidos. Se for analisar qualquer país que conseguiu aumentar o nível de renda dos trabalhadores de forma sustentável, todos eles tiveram ganho de produtividade, aumento de renda per capita por vários anos seguidos”, avalia Souza Jr.
O equilíbrio macroeconômico seria a condição ideal para o Brasil começar a pensar em aumentos expressivos do mínimo, conforme continua o economista. Atualmente, inclusive, mercado e governo concordam que a questão do mínimo tem sido um dos principais entraves para confiança na economia brasileira.
Não à toa, a proposta de corte de gastos apresentada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em novembro deste ano, revisa a política de valorização do salário mínimo. Na prática, o piso nacional continuaria sendo reajustado a partir da inflação, mas com limite de crescimento real fixado em 2,5%.
“Várias políticas públicas, como piso das aposentadorias e pensões do INSS, o BPC [Benefício de Prestação Continuada], o abono salarial, vários programas de transferência de renda são indexados ao salário mínimo. Se aumenta em termos reais um dos principais indexadores dos gastos públicos brasileiros, você gera problema em termos de perspectiva de solvência para o governo e faz com que tenha várias reações, entre elas o aumento dos juros futuros, variação cambial, perda de poder de compra, instabilidade macroeconômica. É bastante direto o efeito”, acrescenta o economista.
Qual o salário mínimo hoje?
O salário mínimo é a base de remuneração para trabalhadores brasileiros, estabelecido na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), para a jornada de 44 horas semanais — ou 8 horas diárias. Hoje, o valor do salário mínimo está fixado em R$ 1.412.
Quem for contratado em um regime de menor carga horária receberá o valor proporcional. Ou seja, calcula-se a hora de trabalho a partir da jornada de 8 horas diárias, para então chegar ao valor correspondente ao horário de trabalho cumprido.
Antes de chegar a esse número, no entanto, o governo federal leva em conta indicadores fiscais, como a inflação e o desempenho do PIB no ano anterior.
“A CLT não traz a previsão de quanto vai ser o salário mínimo. Isso é com base no ano fiscal do governo federal, que avaliará para saber qual é o salário ideal mínimo”, reforça a advogada trabalhista Fernanda Rios, sócia do escritório Costa Oliveira Advogados.
Valor Econômico